A escolha entre ter razão ou criar pontes com o Outro

O que ganhamos e perdemos com ter razão num momento de discussão/diferenças de opinião?

 

Precisamos de –  acredito que urgentemente – falar sobre isto. Num mundo tão polarizado no qual mal nos ouvimos. Mesmo em família.

 

Penso que todos conhecemos a sensação de, quando estamos no meio de uma conversa em que surgem opiniões divergentes, pensar (ou, quem sabe, até admitir) “eu tinha razão”.

 

Na busca de solução para duas gravidezes que não foram até ao fim nos últimos dois anos, passámos por muitos testes, exames e pedidos de autorizações dos mesmos junto da minha seguradora. Numa destas ocasiões, foram-me pedidos inicialmente 15 euros e depois na altura do exame em si foram-me pedidos 950 euros. Até que finalmente conseguimos reverter tudo para os 15 iniciais.

 

Neste processo, tivémos um período complexo de diálogo entre nós (casal) e o hospital em questão, que podia sem dúvida ter corrido muito mal. Em termos financeiros já puderam perceber pelo que disse acima que correu muito bem. Mas, de facto, a raíz da solução esteve na minha constante decisão neste período de trocas de ideias que levou quase uma semana de instituição em instituição, ao telefone para cá e para lá no sentido de eu, interiormente, decidir não querer ter razão. Ou melhor, não me agarrar à minha visão de uma suposta razão da minha parte. E acreditem que sentia piamente que tinha razão.

 

Da experiência de milhares de diálogos anteriores sabia que esta voz interior não poderia vencer. O que teria de estar presente em mim seria tentar resolver a questão. E não provar o que achava ser certo.

 

Tudo isto porque, há vários anos, no meio de uma situação difícil numa dada conversa me fizeram um desafio: “Ana, queres ter razão ou criar pontes com a pessoa com quem não estás a conseguir comunicar?” Este é o desafio que vos lanço no presente texto.

 

Cada um se poderá ouvir com total sinceridade interior em qualquer impasse de comunicação sobre:

– o que ganho em querer ter razão?

– o que perco com querer ter razão?

– o que estou a contribuir para a presente situação do mundo ao faze-lo?

– que impacto tem tido na minha vida escolher num sentido ou no outro?

 

É natural que em situações tensas como a que vivi, no desespero de não encontrar soluções para tentar ser mãe, aos 43 anos de idade, com ovários quase secos e com uma fortuna de contas médicas, esquecer de imediato estas questões que vos deixo para reflexão. Mas eu sabia que nada ia ganhar com querer ter razão. Gosto demasiado da paz de espírito com que vivo quando crio pontes com as pessoas e desperto para ouvir a posição dos outros.

 

Uns dias após termos solucionado o problema compreendi o quanto me precipito a dar respostas a correr e como tenho ao mesmo tempo melhorado neste aspecto. Queria ainda partilhar convosco algumas questões que, olhando para trás, foram importantes:

– neste processo, o meu marido perguntava-me “já preparaste o que tens para dizer” sempre que nos digiriamos à recepção do hospital ou falava ao telefone com alguém envolvido no assunto. Decidi nunca preparar nada.

– optei por sempre ouvir primeiro, por mais tentador que fosse apresentar os meus argumentos.

– tentei proteger todas as pessoas envolvidas. A uma dada altura, foi-me pedido pelo hospital que descrevesse fisicamente a pessoa que me apresentou o valor inicial dos 15 euros para poderem a culpar ou de algum modo poder puni-la. Não quis beneficiar à conta de terceiros.

– ao mesmo tempo, quando sentia que me estava a ser pedido demais ou que o que queriam de mim ia além das minhas responsabilidades na questão, tive a coragem de dizer “esta parte não é minha, é vossa”.

 

Em suma, procuramos no contacto com os outros uma constante confirmação de querermos ter razão ou não? No fim das contas, podemos compreender que tipo de vida estamos a viver ao deixar dominar uma ou outra abordagem. Nada disto tem a ver com auto-controle mas sim com uma decisão bem profunda do que queremos que governe as nossas acções.

 

Criar pontes é de facto, acredito, o nosso maior tesouro que revela a nossa verdadeira humanidade.

Olá, sou a Ana Calha!

Sou professora de inglês há vinte e dois anos e formadora na área da comunicação há mais de onze. 

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